terça-feira, 8 de junho de 2010

IGREJA CATÓLICA (Dinheiro sempre dá confusão)




Por Giulio Sanmartini, de Belluno (Itália) em 9/10/2007

Na Itália, desconta-se do pagamento recebido 0,8% (o oito por mil) de Imposto de Renda, que aqui é chamado imposta sul reddito delle persone fisiche – IRPEF. O contribuinte tem seis entidades religiosas e o Estado para escolher para onde irá seu dinheiro [Igreja Católica Apostólica Romana, o Estado, Igreja Evangélica Valdelsa, União das Comunidades Hebraicas Italianas, Igreja Evangélica Luterana na Itália, Assembléia de Deus e União das Igrejas Cristãs Adventistas do Sétimo dia]. A Igreja Católica Apostólica Romana abocanha 89,81% do total dessa arrecadação, o que, traduzido em dinheiro, equivale a 1 bilhão de euros (mais de R$ 2 bilhões).

Nesta última quarta feira (3/10), o jornalista Curzio Maltese, de la Repubblica, publicou artigo em que o título já diz tudo: "Aonde vai acabar o oito por mil, segredo de um bilhão de euros" (Dove finisce l’otto per mille segreto da um miliardo di euro).

O mundo publicitário considera as campanhas do oito por mil um modelo de comunicação, que a Igreja Católica, a cada primavera, veicula na mídia. Boas tomadas, excelentes fotografias e músicas de Morricone. Foi exatamente nos gastos dessa área que Maltese fez suas pesquisa. Na campanha para acudir os atingidos pelo tsunami que em 26/12/2005 atingiu a Tailândia e Indonésia deixando 230 mil mortos, a Igreja contratou a Saatchi&Saatchi por 9 milhões de euros, mas, segundo a Conferência Episcopal Italiana, foram doados aos flagelados somente 3 milhões, isto é gastou três vezes mais com a propaganda do que com o objetivo da campanha.

Hipocrisias e meias-verdades

Fiéis e não fiéis estão convencidos (pela propaganda) que a Igreja Católica usa os fundos do oito por mil acima de tudo para a caridade na Itália e nos países do terceiro mundo. Todavia, a realidade se mostra bem diferente: do total para esse fim são gastos somente 20% e os restantes 80% ficam na Igreja.

Em 1996, uma voz já esquecida resolveu falar sobre o assunto. Foi a católica ministra para a Solidariedade Lívia Turco, que propôs destinar a cota estatal do oito por mil a projetos para a infância carente. O fato abespinhou o tesoureiro do Vaticano, monsenhor Attilio Nicora, que de forma seca encerrou o assunto: "O Estado não pode fazer concorrência desleal à Igreja". Maltese procurou a ex-ministra e dela ouviu: "Na minha ingenuidade, pensei que a proposta encontrasse a boa recepção de todos, inclusive da igreja, uma vez que a Itália é o país da União Européia com mais alto percentual de pobreza infantil. Ao contrário, a reação da Igreja foi duríssima e, aborrecida, logo me isolei da política: vivi a vicissitude com grande amargura."

Para a Igreja, o trabalho de Maltese não passou batido. O jornal dos bispos Avvenire e o hebdomadário Famiglia Cristiana lançaram-se contra a pesquisa de la Repubblica.

O Avvenire fala de totais hipocrisias e meias-verdades, enquanto a Famiglia Cristiana pergunta: "Quem quer reduzir ao silêncio os católicos?" E continua: "Os padres são vistos como libertinos pedófilos e molestadores sexuais, verdadeiros filhos de Sodoma e Gomorra, enquanto a Igreja é apresentada como um peso falimentar que necessita de ajudas do Estado."

Deus não quer que sobreviva

Ezio Mauro, diretor de redação de la Repubblica, por seu lado, não fez a resposta esperar:

"Conduzir uma investigação jornalística, recolher opiniões, apresentar cifras e balanços tomados de fontes oficiais católicas, por que deve constituir uma ameaça ou uma conspiração para eliminar o pensamento católico do espaço público? Não me consta que na Concordata (Tratado de Latrão, que separou o Reino da Itália do Vaticano), conste talvez uma cláusula desconhecida, que estabeleça áreas para o exercício do jornalismo livre. Ou que os financiamentos da Igreja devam sofrer uma censura não prevista a outras instituições italianas e ocidentais em vigor somente nos países não democráticos?"

A Igreja Evangélica Valdelsa (do século 12), à qual são destinados 1,43% da arrecadação do oito por mil, dá sua opinião através da "moderadora" Maria Bonafede: "O dinheiro dos oito por mil vem da sociedade e para ela deve voltar. Se uma Igreja não se consegue manter com as contribuições espontâneas, é sinal que Deus não quer fazer com que tenha sobrevivência."

Banco do Vaticano é acusado de lavagem de dinheiro




DA FRANCE PRESSE, NO VATICANO

O IOR (Instituto para as Obras Religiosas), conhecido popularmente como o Banco do Vaticano, está sendo investigado pela justiça italiana por uma suposta lavagem de dinheiro, informou nesta terça-feira o jornal "La Repubblica".

O banco, que administra as contas de diversas ordens religiosas, assim como de associações católicas, é uma instituição da Igreja Católica que se beneficia da extraterritorialidade, já que se encontra na Cidade do Vaticano e não se rege pelas normas financeiras vigentes na Itália.

O Instituto esteve envolvido em um escândalo político-financeiro nos anos 1980, pela quebra, em 1982, do Banco Ambrosiano (do qual o Vaticano era um acionista importante) devido ao peso de uma dívida de US$ 3,5 bilhões e um rombo fiscal de US$ 1,4 bilhão.

Segundo o "La Repubblica", 10 bancos italianos, entre eles os poderosos Intesa San Paolo e Unicredit, estão envolvidos no caso.

A justiça italiana suspeita que o Banco do Vaticano administre por meio de contas anônimas, identificadas apenas com as siglas IOR, importantes somas de dinheiro de procedência incerta.

Segundo o jornal, em 2004 "cerca de 180 milhões de euros circularam em dois anos" sem que tenha sido fornecida a identidade dos autores da transação, como exige a lei italiana.

"Indaga-se sobre a possibilidade de que pessoas com residência fiscal na Itália utilizem o IOR para esconder crimes como fraude e evasão fiscal", afirma a reportagem.

"Tratam-se de contas suspeitas", segundo os promotores de Roma citados pelo jornal, que podem solicitar uma rogatória internacional para identificar as instituições e pessoas que se beneficiaram com as operações e descobrir se, assim, entrou dinheiro ilegalmente na Itália.

Há menos de um ano, IOR designou como presidente Ettore Gotti Tedeschi, representante então na Itália do grupo Santander, para substituir Angelo Caloia.

O banqueiro Caloia foi encarregado por João Paulo II em 1989 para a primeira limpeza na administração das contas papais após o escândalo do Banco Ambrosiano, o que permitiu descobrir as ações do tristemente célebre monsenhor americano Paul Marcinkus, o chamado "banqueiro de Deus", falecido em fevereiro de 2006.

Contas milionárias de fundações fantasma, transferências de dinheiro sem controle e vínculos com mafiosos são algumas das revelações do recente livro sobre as finanças da Santa Sé, escrito pelo italiano Gianluigi Nuzzi, com o título de "Vaticano Spa".

O livro denuncia o "período pós-Marcinkus", a década iniciada após o escândalo pelos negócios turvos entre o IOR e o Banco Ambrosiano. (O Arcebispo Paul Marcinkus, na foto, era tesoureiro do Vaticano na época)