terça-feira, 31 de março de 2009

Decisões anacrônicas mostram incapacidade de Ratzinger em guiar o Vaticano

31/03/2009 - 00h01

http://noticias.uol.com.br/midiaglobal/elpais/2009/03/31/ult581u3137.jhtm

El País

Miguel Mora
Em Roma (Itália)

O tantã dos tambores não para. Depois de seu périplo africano e da polêmica sobre a Aids e os preservativos, afirmar que Joseph Ratzinger é um papa cada vez mais questionado é uma obviedade. Fora da Igreja não param as críticas e os ataques. Na França e na Alemanha as pesquisas entre católicos já registram a palavra "demissão" e governos, cidadãos e ONGs demonstram claramente seu descontentamento. Dentro do Vaticano as coisas estão iguais ou piores. O papa alemão foi eleito pelos cardeais por sua alta inteligência. Mas, como diz o veterano vaticanista e escritor Giancarlo Zizola, "estes primeiros quatro anos de papado sugerem que, por mais que sua inteligência seja finíssima, ela não basta para governar a Igreja".

"Ratzinger é um prisioneiro da cúria, vive em uma espécie de Avignon, distante dos episcopados nacionais, sem apoio além do de sua pequena camarilha", explica Zizola, autor do livro "Santità e potere. Dal Concilio a Benedetto XVI. El Vaticano visto dal interno" [Santidade e poder. Do concílio a Bento 16. O Vaticano visto por dentro]. O sacerdote e jornalista Filippo di Giacomo, durante 11 anos missionário no Congo, hoje juiz vicário em Roma, acredita que a crise que vive o Vaticano "reflete uma doença crônica de sete séculos: seu sistema de governo não funciona nem é colegiado". "A cúria moderna é uma máquina gigantesca, inoperante e inútil. Há 35 cardeais em Roma. Estão divididos em grupos, confrontados, e se dedicam a conspirar e cooptar afins pelos corredores", indica Di Giacomo.

Trata-se de uma batalha a toda regra, na qual os lados se misturam e se confundem. A revolta explodiu com o perdão aos bispos lefebvrianos. Um amplo grupo de bispos e teólogos moderados e conciliares (alemães, franceses e sobretudo latino-americanos), cansados de não serem levados em conta, fez ver seu descontentamento ao papa. Em resposta, este repreendeu a cúria por não atuar de forma "colegiada e exemplar".

Zizola lembra que Wojtyla [João Paulo 2º] tentou revelar uma fratura que já existia, à base de carisma e de comunicação. Seu papado cresceu com a televisão e se transformou em uma espécie de Show de Truman, a primeira encíclica católica: o vimos envelhecer, derrubar o Muro de Berlim, sofrer atentados, viajar, beijar o chão do planeta várias vezes, agonizar ao vivo. Mas nem ele foi capaz de reformar o sistema de governo. "Preferiu escapar de Roma e esconder a crise da Igreja e o vazio de governo", diz Zizola.

Enquanto Wojtyla viajava, Ratzinger estuda e escreve. Muito mais isolado e na defensiva, o papa suporta mal que o contrariem. Sua carta aos bispos revelou que lhe desagradam sobretudo o desamor, a intriga, "o ódio e a hostilidade". Seu texto desenha uma cúria conspiradora, que aspira a mandar tanto ou mais que ele, que move os cordões na sombra, que filtra notícias, escondendo a mão, para se fazer valer. A sensibilidade peculiar de Ratzinger é uma parte do problema. Trata-se de um "pastor alemão" como intitulou "Il Manifesto" quando foi nomeado, ou é "um cordeiro no meio de lobos", segundo a expressão do Evangelho de Mateus?

Di Giacomo despachou com ele muitas vezes quando dirigia a Congregação para a Doutrina da Fé: "Você pode lhe dizer qualquer coisa, desde que não eleve a voz. Se a aumentar meio tom, ele fazia seu sorriso estranho, fechava o caderno e ia embora. Diante dele não se pode ofender ninguém. É um democrata-cristão bávaro, e estes são raros. Podem ter ideias avançadas, mas se os outros não as seguem se assustam e freiam. Ratzinger é qualquer coisa menos um aventureiro. Por isso saiu da Universidade de Tübingen no dia em que encontrou os estudantes protestando atirados no chão. É um monge, e ninguém lhe disse há tempo que o mundo midiático não é uma classe universitária".

Em um texto publicado pela revista religiosa "Il Regno", Zizola lembrou que em 1965 o bispo brasileiro Hélder Câmara anunciou ao mundo durante o concílio a reforma da monarquia pontifícia, criando um senado composto por cardeais, patriarcas e bispos eleitos pelas conferências episcopais, para ajudar o papa no governo e convocar a cada dez anos um concílio ecumênico.

A reforma nunca foi feita. A cúria, a corte púrpura, essa entidade invisível e luxuosamente vestida, cujo poder sobrevive aos papas, jamais aceitou a democratização. Hoje dentro da cúria ninguém confia em ninguém. De um lado estão os influentes homens "do serviço", como se autodenominam os diplomatas da secretaria de estado dirigida por Tarcisio Bertone, o único que despacha diariamente com Ratzinger; de outro, os intelectuais orgânicos (jornalistas, professores, juristas, reitores...), alguns papistas e não muitos; e depois há a variada salada cardinalícia e episcopal dirigida pelos "dicastérios" [grandes organizações]: nove congregações, 11 conselhos pontifícios, três tribunais e três oficinas. "Nos dicastérios estão os casos piedosos", diz Filippo Di Giacomo. "Desde Paulo 6º, o papa que internacionalizou a cúria e a recheou de excelência com os melhores cérebros dessa época, a decadência da equipe de governo foi constante. Wojtyla chegou a Roma em 1978 cheio de ódio contra a cúria, porque ninguém escutava os bispos do Leste Europeu, e trouxe todos os fracassados, os que não serviam para as dioceses", conta Di Giacomo. "López Trujillo, Castrillón Hoyos, Martínez Somalo, Martino, Barragán, Milingo... gente insignificante. Depois tornou bispo seu secretário e lhe disse: 'Dessas bestas você cuida'."

Poderá este papa, mais tímido ainda, apaziguar esse rebanho de "gálatas que mordem e devoram"? Segundo Zizola, "o papa trabalhou durante o concílio na fronteira da renovação e sabe que o grande problema é a participação nula dos bispos no governo da Igreja. Alguns cardeais lembram que os bispos eram consultados mais frequentemente na época de Pio 12, antes do concílio, do que atualmente".

Perto do papa, concordam Zizola e Di Giacomo, está o deserto. Quatro freiras americanas que dirigem o departamento de informática e evitam que os hackers entrem no site. Seu secretário, o belo, alto e bávaro Georg Genswein, é considerado um zero à esquerda. "É um cretino", afirma sem rodeios um membro da cúria. O porta-voz, o amável jesuíta Federico Lombardi, e seus dois ajudantes não dão conta de apagar incêndios e que segundo se diz serão substituídos em junho.

Os homens de confiança são ainda menos. O cardeal alemão Lehman, que culpou os mensageiros pelo desastre Williamson; Bertone, o secretário de Estado que também deixará seu lugar em breve devido à idade. Antonio Cañizares, prefeito da estratégica, segundo a visão de Ratzinger, Congregação para o Culto Divino. E o lituano Audrys Juozas Backis, que poderá substituir Bertone. Muito poucos para um homem de 81 anos com uma enorme carga de trabalho. "O grau de complexidade do cargo, com 1,1 bilhão de católicos, 6 mil bispos na ativa, relações ecumênicas e interreligiosas, viagens, encíclicas e relações de Estado, é insustentável para um homem só, inteligente como Ratzinger ou carismático como Wojtyla", diz Zizola.

Por isso há muitos bispos em guerra. Enquanto Ratzinger salta de um pântano para outro, a Igreja moderada, progressista e conciliar não aguenta mais. Segundo Zizola, o poder da Opus Dei, como nos tempos de Wojtyla e Navarro Valls, continua enorme. Di Giacomo não acredita que seja tanto. Mas a máquina de enredar está funcionando. Com o perdão dos lefebvrianos, o papa desprezou as correntes de sinal oposto, especialmente a Teologia da Libertação, que o mesmo freou há 25 anos. Ao fundo, já se fala em um possível substituto, o cardeal de Honduras Óscar Andrés Rodríguez Maradiaga. Mas isso a cúria decidirá.

Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

terça-feira, 17 de março de 2009

Bento 16 faz primeira visita à África como pontífice Por David Lewis

IAUNDÊ (Reuters) - O papa Bento 16 embarcou na terça-feira em sua primeira visita à África como pontífice, buscando apoio para o continente durante a crise econômica mundial e esperando incentivar a paz e ajudar a promover o combate à corrupção.

O papa iniciou sua visita a dois países por Camarões, onde trabalhadores caiaram muros, recolheram o lixo e os ambulantes foram tirados das ruas na terça-feira, nos preparativos para a visita papal.

Embora o número de católicos praticantes venha diminuindo no mundo desenvolvido, a África, onde alguns avanços democráticos vêm sendo feitos mas ainda há conflitos e crises em ebulição, é vista como vital para o futuro crescimento da Igreja.

Entretanto, a política controversa do Vaticano em relação ao uso da camisinha ainda é motivo de polêmica num continente onde a Aids já matou mais de 25 milhões de pessoas desde a década de 1980.

Enquanto médicos defendem o uso da camisinha para ajudar a frear o avanço da Aids, a Igreja insiste na fidelidade dentro do casamento heterossexual, na castidade e na abstinência sexual.

"O problema não pode ser superado com a distribuição de camisinhas. Isso apenas aumenta o problema", disse o papa a jornalistas a bordo do avião, a caminho da África.

Nos Camarões, Bento vai visitar organizações beneficentes, reunir-se com lideranças muçulmanas e comparecer a uma reunião de bispos que vão tentar mapear o papel da Igreja nas tentativas de melhorar a vida dos africanos. Ainda esta semana, Bento vai embarcar para Angola.

Um outdoor no centro de Iaundê mostrava uma foto do papa e do presidente Paul Biya, com a legenda "uma comunhão perfeita".

Mas muitos na capital estão céticos, especialmente depois que, na semana passada, as autoridades destruíram barracas de feira numa tentativa de limpar a cidade antes da chegada do papa.

"Estou feliz por ele estar vindo, mas ele deveria vir pela religião, não por outras coisas", comentou Calvine Noumbisi, 29 anos, que estava agachada ao lado de uma rua, vendendo terços, livros de orações e incenso para uso numa igreja próxima.

Embora Camarões e Angola sejam países ricos em recursos naturais, onde o petróleo é explorado há anos e milhões de dólares em minérios já foram extraídos da terra, a maioria de seus moradores continua a viver na miséria.

Muitos esperam que esse fato obrigue o papa a pedir que os líderes do continente ponham fim a anos de abuso do poder e má gestão pública.

Na igreja católica São Francisco Xavier, membros da irmandade Ephphata cantavam, dançavam e oravam, suando em suas camisetas políticas, vestidos com estampas religiosas e camisetas de futebol inglesas.

"Estamos felizes", disse Robert Nguidjoi, enquanto os fiéis iam ao altar para receber a bênção do padre. "Jesus veio para salvar os pecadores. Camarões está doente, então estamos felizes porque ele veio nos salvar."

sábado, 14 de março de 2009

Em artigo, Vaticano critica excomunhão de envolvidos em aborto em menina brasileira

CIDADE DO VATICANO, 14 MAR (ANSA) - O Vaticano afirmou que antes de pensar na excomunhão dos envolvidos no aborto feito na garota brasileira de 9 anos que ficou grávida de gêmeos após ser violentada pelo padrasto, "seria necessário e urgente salvaguardar sua vida inocente".
"Antes de pensar em excomunhões seria necessário e urgente salvaguardar sua vida inocente, devolvendo a ela um nível de humanidade", disse o presidente da Pontifícia Academia para a Vida, monsenhor Salvatore Rino Fisichella, em artigo publicado pelo jornal vaticano L'Osservatore Romano com data de domingo, 15/3.

As declarações de Fisichella contrastam com a decisão do arcebispo de Olinda e Recife, Dom José Cardoso Sobrinho, que dias após o aborto da menina anunciou a excomunhão de sua mãe, dos médicos e dos integrantes de ONG's envolvidos no caso.

"A terrível historia da violência cotidiana" da qual a menina foi vitima, sofrendo abusos frequentes por parte de seu padrasto, "teria passado despercebida com a intervenção do bispo", observa o presidente da Pontifícia Academia para a Vida.

Para o representante do Vaticano, a menina brasileira "deveria ter sido defendida antes de tudo", mas "não foi feito isto, lamentavelmente, prejudicando a credibilidade de nossas instruções que, para muitos, parecem marcadas por insensibilidade, incompreensão e falta de misericórdia".

A criança, admite o prelado no artigo, "levava dentro de si outras vidas, tão inocentes quanto a sua, embora frutos da violência, e que foram suprimidas, mas isso não era suficiente para fazer um julgamento que pesa como um machado".

O caso da menina ganhou destaque na mídia internacional, em meio a protestos contra a decisão de Dom José. A repercussão se tornou ainda maior pela postura da Igreja Católica em um Estado laico, interferindo diretamente nas decisões judiciais, e porque o padrasto, acusado de violentar a menina de 9 anos e sua irmã, de 14, não foi excomungado.

No fim de semana passado, comunidades eclesiais de base italianas afirmaram que a decisão do arcebispo brasileiro demonstram, "mais uma vez, o sentido de distanciamento radical entre a 'Igreja do Poder' e os dramas humanos".

Em uma nota emitida na ocasião, as comunidades também criticaram o Vaticano por sua postura, afirmando que a Santa Sé teria apoiado a postura de Dom José.

Casos de pedofilia nos EUA custaram US$ 400 mi à Igreja em 2008

Washington, 14 mar (EFE).- A Igreja Católica dos Estados Unidos desembolsou mais de US$ 400 milhões, em sua maioria em indenizações, para enfrentar o problema dos sacerdotes pedófilos em 2008, segundo informa um relatório oficial.

A Igreja investiu mais de US$ 23 milhões para lutar contra os abusos de menores, US$ 22 milhões em tratamento para as vítimas e US$ 374,4 milhões em indenizações pagas a cerca de 500 pessoas.

As despesas para 2008 foram 29% mais baixas em relação a 2007, após três anos consecutivos de aumento.

A grande maioria dos casos de abusos são de entre 35 e 45 anos atrás, sobretudo no período de 1970 a 1974, segundo o relatório, encarregado pela Conferência de Bispos Católicos dos EUA.

Durante 2008, a nota diz que foram feitas 620 denúncias de abusos cometidos em anos anteriores, mas apenas "dez novas denúncias críveis de abusos a pessoas que ainda têm menos de 18 anos de idade".

quinta-feira, 12 de março de 2009

Internet faz até Papa mudar de ideia

http://colunistas.ig.com.br/ricardokotscho/2009/03/12/internet-faz-ate-papa-mudar-de-ideia/

Excomunhão é mesmo uma lei de Deus que ninguém pode contestar?

Uma informação perdida no meio de um despacho da agência espanhola EFE mostra como a internet pode fazer até o Papa Bento 16 admitir que errou por ter revertido a excomunhão de quatro bispos ultraconservadores ordenados pelo arcebispo Marcel Lefèbvre, fundador da Sociedade São Pio 10º.

Se até o Papa, diante da reação da opinião pública manifestada pela internet, reconheceu falhas no processo de reversão da excomunhão de bispos radicais e mudou de ideia, por que o mesmo não pode acontecer, em sentido inverso, com o arcebispo José Cardoso Sobrinho, da Arquidiocese de Olinda e Recife, aquele que excomungou os médicos e a mãe da menina de 9 anos estuprada pelo padastro, grávida de gêmeos?

O Papa Bento 16 enviou carta manuscrita a todos os bispos católicos na qual cita erros na condução do caso e admite que a Igreja “não se deu conta” da forte reação às declarações do bispo Richard Williamson feitas pela internet, ao negar o Holocausto, que “se sobrepuseram de modo imprevisível à reabilitação dos prelados, causando um curto-circuito midiático que alterou o caso”.

Fundamental na recente campanha que elegeu Barack Obama para presidente dos Estados Unidos, a democratização do debate público pela internet finalmente chega à Igreja Católica, levando o Papa a admitir que a gestão do processo que revogou as excomunhões não foi “suficientemente explicada”.

Ainda está em tempo de dom Sobrinho se informar melhor sobre o que circula na internet brasileira a respeito das suas declarações sobre excomunhão, estupro e aborto no caso da menina de Alagoinha e, quem sabe, também rever sua decisão.

domingo, 8 de março de 2009

O que mais sensibiliza: o estupro, o aborto ou a excomunhão?

Desnecessário revisitar em descrições o caso recem ocorrido da menina de 9 anos estuprada pelo pai, submetida a um aborto "terapeutico" (as aspas são pelo uso do termo um tanto contraditório) e seguido de excomunhão pelo Bispo de Recife. Tudo ocorrido na última semana.

Meu propósito aqui é não "chover no molhado" e, como pode parecer óbvio para qualquer leitor desse blog (se é que existe algum, sic), resumir uma nova configuração dos fatos.

Minha sugestão: Aos pais, fé (em Deus, claro); aos médicos, paz (uma vez que cumpriram com seu juramento hipocrático); ao estuprador, justiça (é o máximo que podemos esperar que não signifique vingança ou ódio simplesmente); e ao bispo, consequência (uma vez que seu nome será lembrado eternamente como o "excomungador", a despeito do apoio "canônico" no mundo conectado onde a informaçao não se esvai tão rapidamente, isso tem importância).

Ao fim de tudo, um pequeno saldo positivo (pequenino, frente a à dureza dos fatos): a aparição de alguns indivíduos que justificam o nome desse blog.
Vide: http://colunistas.ig.com.br/ricardokotscho/2009/03/08/aborto-e-excomunhao-catolicos-envergonhados/